Parte II - O CONTO DO TANOEIRO
CONTOS GASPARENSES
Parte II - O CONTO DO TANOEIRO
Texto completo (imagens ilustrativas)
O Conto do Tanoeiro está ligado à história da mineração em
Gaspar. A busca por ouro na região remonta ao século 19, porém sem grandes
descobertas além das atividades de garimpeiros isolados. A atividade de
exploração desse minério ganhou força ao longo da década de 1940, quando
centenas de trabalhadores exploravam a região do Arraial. Nos anos de 1970 e
1990 novas empresas passaram a realizar a exploração do ouro na localidade, que
ao longo de suas atividades retiraram boa quantidade do cobiçado minério. O
desejo de encontrar ouro gerou muitas histórias curiosas, como a do Conto do
Tanoeiro que passaram a enriquecer a cultura popular da cidade.
Dizia-se, que em Gaspar se encontrariam ricas ocorrências de ferro. Creio que Gaspar, neste particular não é exceção, uma vez que é sabido, que toda a área da serra do mar acusa ocorrência de minério de ferro em maior e menor quantidade.
O ouro sempre foi e continua sendo a grande sedução do
homem. Em torno dele giram histórias e fatos, acontecimentos felizes e
trágicos. E não vezes ele tem mudado o curso de vida de indivíduos e de povos.
O acontecimento que será apresentado a seguir é fruto de uma
crônica popular que por muitos anos divertiu a comunidade.
Vizinho destas terras, foi um pequeno sitiante, um desses
tipos espertos, de andar ligeiro e costumes característicos dos nossos
praieiros. Era ele um misto de sagaz e astuto, de ingênuo e manhoso, que
gostava de conversa e sempre “sabia muita coisa”.
Quase que diariamente vinha a
cidade, à tarde, para inteirar-se das novidades. Fumava seu cigarrinho de palha
e contava suas histórias de pescaria e de caçadas de arrepiar os cabelos dos
que ouviam. Seu ponto predileto sempre foi a oficina de um tanoeiro que
trabalhava para uma firma exportadora de aguardente. Este era o tipo do gozador
e gostava de incitar o homenzinho para que contasse as suas histórias,
animando-o a enfeitá-las sempre mais com fatos inéditos. Ao grupo costumava
juntar-se o farmacêutico que viera do Rio de Janeiro e estabelecera-se em
Gaspar. Era ele, também um desses homens que gostava de divertir-se à custa dos
outros, se bem que o fazia com ares muito sério e dificilmente traía as suas
intenções de divertir-se com o que ouvia; ao contrário, com a cara mais séria
do mundo, reforçava as fantásticas narrativas do sitiante, acrescentava-lhes
fatos ainda mais espantosos.
Certo dia, o tanoeiro e o farmacêutico combinaram
pregar uma peça ao visitante.. Confabularam e quando o homenzinho chegou à
oficina do tanoeiro, este lhe disse que
soubera que o farmacêutico estaria interessado em comprar seu sítio para
um grupo de americanos, que sabiam que nele havia ouro em abundância. Pediu que
nada contasse ao farmacêutico do que lhe estava dizendo, porque aquele lhe
havia pedido segredo. O sitiante logo ardeu de cobiça e pediu ao tanoeiro que
procurasse saber algo de mais positivo sore o negócio e que, se este se
realizasse, ele lhe daria uma boa comissão. Diariamente voltava à oficina e
punha-se a escutar as conversas do farmacêutico. Este, de vez em quando,
deixava escapar uma frase alusiva ao suposto negócio, sem porém, expressar-se
claramente e procurando ocultar do sitiante, o que pretendia contar ao
tanoeiro. “Os americanos escreveram-me novamente...” dizia ao tanoeiro. “Recebi
notícias dos homens..., querem que eu apresse o negócio...”. Depois dirigia-se
ao sitiante,, com ares de quem nada queria, e perguntava: Você estaria disposto
a vender o seu sítio?’ ao que o outro matreiramente respondia: “Depende da
oferta...”. O farmacêutico mostrava-se aparentemente desinteressado, mas
deixava sutilmente transparecer, que amigos dele queriam comprar a propriedade
do sitiante, para nela plantar cana-de-açúcar. Depois retirava-se e o tanoeiro
dizia ao sitiante: não lhe disse? Ele quer comprar seu sítio para os
americanos, porque nele existe muito ouro... Os americanos são homens de muito
dinheiro”.
Nestas conversas passaram-se algumas semanas, até que um dia
o tanoeiro disse ao sitiante: “Quando você está presente o farmacêutico não se
abre. Só o faz quando está a sós comigo. Amanhã volte mais cedo e deite-se
naquela tábua, debaixo do telhado, por cima de minha bancada de trabalho. Ali,
escondido, você poderá ouvir tudo o que ele me diz. Quando o sitiante se
retirou, informou ao farmacêutico da combinação que fizera com o mesmo. Logo
depois do meio dia, no dia seguinte, o sitiante apareceu e deitou-se sobre a
tábua debaixo do telhado da oficina. Fazia um calor horrível, mas atentando às
recomendações do tanoeiro, conservou-se imóvel e calado.
Não demorou, chegou o farmacêutico e foi logo dizendo ao
tanoeiro: “Vou fazer o negócio da compra do sítio do fulano, mas quero
compra-lo barato para ganhar bastante na venda aos americanos. Lá existe muito
ouro e os americanos pagam qualquer preço”. E, assim, foi falando umas duas
horas, enquanto o sitiante sofria com o calor debaixo do telhado, mas sempre
atento ao que falavam. Suando em bicas, ele desceu de seu esconderijo quando o
farmacêutico se retirou da oficina, porém, bastante satisfeito com o que havia
escutado. Apenas estava desgostoso por “ouvir as intenções do safado que quer
enriquecer à minha custa”. No dia seguinte, o farmacêutico o interpelou
diretamente: “Você quer vender seu sítio? Qual o preço que pede por ele? Eu
posso comprá-lo à vista”. Lembrando o que ouvira no dia anterior, o sitiante
pediu um preço exorbitantemente elevado. Daí em diante, dia por dia, teve lugar
uma pechincha das arábias. Um pedindo muito, o outro oferecendo pouco, até que
certo dia o farmacêutico, mostrando-se bastante aborrecido apareceu na oficina
e foi logo dizendo ao tanoeiro que os homens haviam desistido do negócio. E foi
andando.... O sitiante pareceu petrificado com a notícia de que não mais
venderia seu sítio e o tanoeiro lhe disse: “Veja que negócio você perdeu; é que
você pediu um preço muito elevado”. O sitiante começou a vociferar contra o farmacêutico,
atribuindo a este o malogro do negócio, e daí por diante, quando vinha à
cidade, só entrava na oficina do tanoeiro, depois de ter-se certificado de que
lá não estava o farmacêutico. Mas a cidade toda já ficara sabendo do negócio e
assim a crônica jocosa de Gaspar ficou acrescida de mais um elemento que
durante anos era lembrado quando os gaiatos se reuniam para passar algumas horas
alegres.
Fonte: Memórias de
Henrique Pedro Zimmermann – In: Memória Gasparense, número 4; Abril de 1995.
Pesquisas: Robson Gallassini (in memoriam).
MATERIAL NÃO PEDAGÓGICO.
APENAS DE ENTRETENIMENTO.
Os quadrinhos são meramente ilustrativos.
Para realizar pesquisas, consulte o ARQUIVO HISTÓRICO MUNICIPAL, ACESSANDO O LINK ABAIXO:
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